Crítica: Bird People: Pessoas-Pássaros [por Marise Carpenter]

Por Marise Carpenter
3a Mostra Joias do Cinema Francês


"Bird People", dirigido pela francesa Pascale Ferran, seria uma história já tratada no cinema inúmeras vezes, não fosse as diversas nuances com que este filme percorre seus 127 minutos, passando do experimental ao tradicional e incorporando ao final uma animação surpreendente. As cenas iniciais são geniais e também nos pegam (só vendo para que o espectador entenda literalmente essa frase). É cinema experimental da melhor qualidade que serve para nos dizer: olhe a complexidade da vida, olhe a diversidade de pessoas, olhe bem o que vem pela frente.

E é por essa frente que o foco fica em Gary e em Audrey. Um é executivo americano que viaja a Paris para uma reunião de negócios e em seguida a uma viagem para Dubai hospedando-se por uma noite em um hotel com vista para o aeroporto. A outra é uma jovem camareira que trabalha no hotel.

Para Gary, o formato apresentado pelo filme é tradicional, enquadrado no estilo americano, mostrando um personagem estressado, entediado e desencantado com a vida, com crises de ansiedade e angústia que (não) se soluciona com cigarro, whisky e remédios, ingredientes clássicos de um executivo americano. 

Para Audrey, o foco é no estilo francês de cinema. Tédio silencioso, falas silenciosas, voyeur por solidão quando chega em seu apartamento, sempre um leve toque de suspense cada vez que entra em um quarto para limpar. 

Ele implode e explode. Muda tudo, resolve todas suas ansiedades e angústias de uma vez só. Tudo se passa dentro dele e do seu quarto de hotel pelo celular e pelo notebook. Tudo mesmo. Tudo é tudo. Não sem sofrer, sem chorar, mas, ao final, leve, livre e solto.

Ela também explode e implode. E, como um fenômeno, sua transformação se dá no quarto de Gary quando entra para limpar, mostrando dessa forma a interseção que a diretora quis dar entre esses dois personagens e que no fundo representam pessoas da cena inicial, ou seja, todos nós. A transformação de Audrey nos remete ao título do filme e a mais uma nuance: a de animação. Que é surpreendentemente real. Extremamente bem feita. 

Daqui em diante parece que estamos assistindo a um outro filme, mas somente em seu formato porque toda a aventura que vem pela frente é costurada no mesmo ambiente e com os mesmos personagens de toda a história.

Gary, de sua janela de hotel, vê aviões subirem e descerem o tempo todo e dá a impressão de que nada desse sobe e desce carregando centenas de pessoas pra lá e pra cá faz sentido quando não estamos. Parece que sua decisão de mudar tudo partiu daí e assim, ganhou coragem para ter essa liberdade.


Audrey, solitária, cansada, desesperançada e entediada da vida que levava, que só olhava para as quatro paredes dos quartos, que só catava os restos e lixos deixados, que “arrumava” a vida para os outros, voa!

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