Crítica: Boa Noite, Mamãe

Por Fabricio Duque

Quanto menos explícito na manipulação de sustos no gênero terror-horror, e mais intervenções psicológicas, então a imperatividade da estrutura sombria acentua-se, como é caso do filme perturbador “Boa Noite, Mamãe”, de Veronika Franz e Severin Fiala, pois aborda a esquizofrenia personificada e comportamental de uma criança, que “provocada" por acontecimentos traumáticos, “adulterou" sua mente à filosofia “mimada" de que “os fins justificam os meios” (uma crueldade sádica inerente do meio infantil) à “conquista" da paz e da salvação. Aqui, a narrativa não se preocupa em esconder inicialmente o detalhe-surpresa (sacado "logo de cara”), em assumir a obviedade da espera, e em preferir o desenvolvimento do enredo minimalista-realista, transformando fantasmas-visões em personagens concretos. Mesmo com o alto nível de violência, tanto física, quanto cerebral, é um longa-metragem, acima de tudo, família, que se utiliza da loucura - o desequilíbrio mental - a fim de “libertar" o ente querido da alienação-fuga social (o culto ao corpo - e a imagem mascarada, a futilidade, a invisibilidade, a incomunicabilidade, a individualidade) e “conservar" os valores do ninho caseiro (a permanência do amor incondicional e da união eterna). “Boa Noite, Mamãe”, fragmento de um musical (explícito na primeira cena), escolhido pela Áustria ao Oscar 2016 de Melhor Filme Estrangeiro (mas não foi selecionado entre os cinco concorrentes), e integrante da edição 71 do Festival de Veneza, conta a história de uma família que vive em uma residência isolada em meio a árvores e plantações de milho. Após dias afastada por conta de cirurgias plásticas, a mãe (Susanne Wuest, de “O Campeão de Hitler") volta para casa e não é reconhecida pelos filhos gêmeos Lukas (Lukas Schwarz) e Elias (Elias Schwarz). As crianças, de nove anos, duvidam que a mulher de rosto coberto seja realmente sua mãe e a partir de então nada será como antes. “Boa Noite, Mamãe” é um legítimo exemplar do suspense, visto que prende, plena e,inquestionavelmente, o espectador, o imergindo no submundo-trama da co-dependência cognitiva. Um “prato cheio” a psicólogos e psiquiatras, devido às camadas “viajandonas" da mente humana, que transmuta o abstrato imaginado em possibilidades palpáveis do existir. Concluindo, um filme que não causa medo, mas incomoda principalmente se nos deixarmos levar pela relação visceral entre uma mãe e “seus" filhos, esta sagrada, pura, intocável, virtuosa, delicada, projetada e dotada de perfeições humanizadas sem erros, conflitos e excessivamente apaixonadas. Quando se quebra o padrão e a lógica é desarmada, então resta submetê-la ao desequilíbrio por uma força maior a da vontade de um ser humano. Altamente recomendado.