Crítica: Conspiração e Poder

Por Fabricio Duque

“Conspiração e Poder” podia cair na maldição de ser uma oportunista versão televisiva do vencedor do Oscar 2016 de Melhor Filme, “Spotlight - Segredos Revelados”. Sim, poderia. Mas não é por dois elementos indiscutíveis. Um é a amarração-edição da trama-biografia de Mary Mapes, uma repórter do programa “60 Minutes”, da CBS News, que talvez por impulso jornalístico, crença demasiada em sua reputação de excelente profissional, busca desesperada pelo furo, provação-respeito de seu pai, confiança no “sigilo" das fontes, “curiosidade" e ou até mesmo um escondido sensacionalismo-revolta contra George W. Bush, tenha desprendido tempo, energia e “coragem" para “provar" que o presidente em eleição não tinha servido na guerra do Vietnam. Aqui, no longa-metragem, baseado no livro “Truth And Duty: The Press, The President, and the Privilege of power (Verdade e Dever: A Imprensa, O Presidente, E o Privilégio do Poder)”, escrito pela própria personagem principal, dirigido e roteirizado pelo americano estreante James Vanderbilt (roteirista de “Zodíaco”, de David Fincher; “Homem-Aranha”, de Sam Raimi), o desenvolvimento da história é o que menos importa porque nos leva ao segundo elemento: a interpretação irretocável (quase monólogo) de Cate Blanchett personificando-traduzindo, quiça “incorporando" (literalmente), Mary Mapes. Sim, ela de novo, que “rouba” a cena “descaradamente”, brilhando de forma tão natural-espontânea (com suas nuances, sutilezas, existencialismo reflexivo-expressionista, que deixou os outros do elenco (Robert Redford, Denis Quaid, Elizabeth Moss, Bruce Greenwood, Topher Grace) como meros coadjuvantes “preenchedores" do jogo realista de cena em que só há uma “rainha”. Sim, é algo monstruoso, que só corrobora a qualidade “sobre-humana” de Cate, gerando no espectador “pena" dos pontas que contracenam com ela, que “acolhe" a interpretação alheia, fornecendo equilíbrio, ritmo e cadência. Assim, nós até aceitamos (“engolimos" é a palavra certa”) os constantes gatilhos comuns da narrativa (a câmera lenta, a música de efeito, a “verdade" patriótica americana, a “proteção" de seu “líder”, os clichês tendenciosos do roteiro), bem à moda de “JFK - A Pergunta Que não Quer Calar“, de Oliver Stone. Sim, tudo é esquecido quando temos Cate Blanchett. A sinopse nos conta que a produtora da CBS, Mary Papes, juntamente com o âncora Dan Rather (Robert Redford) suspeitam de que o presidente George W. Bush foi um dos muitos jovens privilegiados que usou os seus contatos para não combater na Guerra do Vietnã. Armando uma exposição, os dois pretendem levar a história ao ar, mas o fato só começa uma guerra entre o poder constituído na tentativa de tirar o crédito das informações, o que abala o emprego dos dois contratados da CBS, quase altera as eleições e quase leva toda a CBS News abaixo. Não podemos negar também o questionamento que o tema traz: a pressa em se produzir matérias investigativas, sem autenticações de documentos, por exemplo. O filme em questão é exponencialmente atual no universo brasileiro, época que dados, estatísticas, “pseudo" boatos viram notícias de “vendagem" premiada. Não muito distante, no documentário “Eu sou Carlos Imperial”, uma fofoca depreciativa de seu “protagonista” a Mário Gomes e sua “cenoura” em um jornal fez com que a “verdade" ganhasse da “credibilidade”. Até hoje os “leitores" e público em geral não sabem sua veracidade. O simples fato de “plantar" fogo acaba por estimular a queimada. Cada vez a informação é menos conferida, e mais temos “erratas”. Acima de tudo é um filme sobre o objetivo-essência do jornalismo, claro com intercalações de paralelos dramas familiares. Como já foi dito, caro leitor-cinéfilo, não se prenda aos detalhes e sim na descomunal interpretação “não interpretativa” de sua atriz protagonista. Altamente recomendado.