Crítica: O Abraço da Serpente


Nota da Redação. A Premiação do PRÊMIOS PLATINO DEL CINE IBEROAMERICANO aconteceu no dia 24/07, no Uruguai. O grande vencedor foi "O ABRAÇO DA SERPENTE", que ganhou Melhor Filme de Ficção, Melhor Direção, Melhor Música Original, Melhor Montagem, Melhor Direção de Arte, Melhor Fotografia e Melhor Direção de Som. E nosso brasileiro "Que Horas Ela Volta?", de Anna Muylaert, que está em cartaz com "Mãe Só Há Uma", venceu na categoria de Cine y Educación en Valores. 

Por Fabricio Duque

Talvez os votantes do prêmio Oscar estejam realmente modificando suas percepções de palatáveis exemplos da cinematografia hollywoodiana a experimentações estéticas, como é o caso do colombiano “O Abraço da Serpente”, que foi indicado a Melhor Filme Estrangeiro. O longa-metragem constrói a representação de uma viagem-jornada (quase uma máquina do tempo ao passado) à antropologia-etnografia de tempo ficcional. Por uma fotografia em branco-e-preto, o filme imerge o espectador nos costumes, passado, mitologia, presente, futuro, tradições, extermínios, “podações", lendas, crenças e políticas sociais dos índios da floresta amazônica. Aqui, há o discurso desconfiado-raivoso contra os “homem branco”, que buscou eliminar a língua nativa do “diabo" pela cruel dominação com o objetivo da “salvação”. “O Abraço da Serpente” é acima de tudo uma luta poética-utópica de um incorruptível indígena para conservar sua cultura, “ensinando" aos seus “algozes" (jesuítas e historiadores), a simplicidade das pequenas vivências (“Para que você precisa de tantas coisas?”), do contato com a natureza e da paciência, seguindo que “o rio dá o tempo do remar”. Por “esquetes”, estes protagonistas (um branco, um índio que prefere ser branco e o outro que insiste em “respeitar" sua essência) do passado, que são “interpretados" por novos “aventureiros" (um que quer conhecer, e outro que quer lembrar), “embrenham-se” pela história, pelas influências sócio-culturais, pelo auto-desprendimento das “amarras" da própria existência (como a bússola, as malas - que criam a conexão com o mundo de origem, a fotografia que permite “visualizar o outro eu vazio”), e pela metáfora-instantânea (da última yakruna, uma poderosa “planta-droga” alucinógena capaz de “ensinar a sonhar") em si, de “reencontro" para consequentemente “ganhar força”. O filme, que busca abrigo no tempo cinematográfico de Lav Diaz, reverbera de forma catártica a mensagem (à moda psicodélica “2001”, de Stanley Kubrick) de sua parábola (um poderoso xamã amazônico Karamakate - último sobrevivente de sua tribo - vive em isolamento voluntário nas profundezas da selva) de que a resposta-conhecimento (para todos) está na odisseia do próprio homem quando “liberta" seus “empecilhos materiais”. Os anos de total solidão transformaram este “selvagem" em um Chullachaqui (um homem de “cópia oca, vazia, de um ser humano que perambula pela selva à espera de alguém para enganar - todos os seres humanos do mundo têm um Chullachaqui exatamente igual em aparência, mas completamente oco por dentro”), privado de emoções e memórias, mas que perpetua seus desenhos rupestres em pedras com o intuito de exteriorizar sonhos e impedir esquecimentos e “espíritos transcendentais”. O ator Brionne Davis, que interpreta Evans, disse que o maior desafio foi a língua (“Levei até três horas para memorizar uma linha em uitoto”), entre os locais reais nos quais os exploradores que inspiraram a história baseada nos diários escritos pelos cientistas Theodor Koch-Grunberg e Richard Evan Schultes. “É uma ode ao equilíbrio e à harmonia com a Mãe Terra, uma espécie de lembrança - calderão multi-racial, multi-linguístico e multi-cultural - para o resgate da Amazônia exista na memória coletiva”, finaliza o diretor Ciro Guerra (de “As Viagens do Vento”, “La Sombra del Caminante”). O longa foi apresentado na seção "Quinzena dos Realizadores" do Festival de Cannes 2015. É a primeira produção colombiana a ser indicada ao Oscar de melhor filme estrangeiro. Recomendado.