Por Fabricio Duque
“Adeus à Linguagem” representa a
mais nova experiência sensorial do diretor Jean-Luc Godard. O “mestre” francês
(que objetiva estender a ‘nouvelle vague’ aos dias atuais) desconstrói a
narrativa visual ao se utilizar da linguagem em terceira dimensão a fim de
metaforizar explicitamente uma crítica ao próprio cinema, seu “futuro” e sua iminente
“morte”. Godard (de “Acossado”, “Film Socialisme”, “Nossa Música”) apresenta-se
como um cineasta inquieto e obcecado por novas mídias. O longa-metragem de
apenas setenta minutos não apela à forma palatável, pelo contrário, quer porque
quer mitigar qualquer resquício de normalidade convencional e qualquer “zona de
conforto”, quebrando com subterfúgios de uma “orgia” de imagens que cria um
conflito desnorteado e entendimentos para com o espectador, principalmente
quando insere uma cena 3D em outra 3D, resultando em uma vertigem psicodélica da
experiência “traumática” assistida. Jean-Luc Godard é um gênio, que está pouco
se importando com a “facilidade” alheia. Ao “complicar” o já complexo processo
de “universo” etéreo, desencadeia uma admiração pelo respeito à capacidade de
inteligência de cada um. “Aqueles que não têm imaginação, buscam refúgio na
realidade”, diz-se sobre um homem e uma mulher que dividem a intimidade em uma
casa, lugar que mora também um cachorro (que ganhou o Palm Dog no Festival de
Cannes 2014). Ela é casada, mas não há qualquer informação sobre sua vida fora
daquele local. Os dois conversam sobre a questão da linguagem sob o ponto de
vista filosófico, enquanto que o cão a tudo observa. Godard (que ganhou o Prêmio
do Júri no Festival de Cannes 2014) corrobora sua característica de “libertar”
(e desestruturar) a câmera e o tempo filmado, prolongando ações já “compreendidas”
e estimulando a paciência do “escolhido” (o espectador) no “templo” cinéfilo. O
diretor, que já “brincou” de 3D em um curta-metragem da coletânea trilogia “3x3D”,
“leva” as últimas consequências seu “espírito” radical, seu discurso “utópico”,
sua “luta” pela qualidade a qualquer custo. O filme pensa muito e todo o tempo.
Há uma verborragia questionadora que “tenta” ser um diálogo, mas que se
expressa em um “surdo” monólogo de um individualismo “atroz”. “Resta saber se o
nãopensamento contamina o pensamento”, é dito entre provocações, ideias
repetidas e redundantes, analogias, simbolismos, decretações, sadismos,
verdades, ilusões, filosofias (“um ser que está em ser”), políticas (pragmáticas
e históricas) e culturas ora clássicas e ou populares e ou contemporâneas e ou
ora coloquiais. Concluindo, Godard, que pediu que nem todas as cenas fossem
legendadas, confunde, transforma o mundo em “uma floresta” e “faz a paz como
fez a guerra” e que “a experiência interior está interditada pela sociedade”, que
“cada um deve pensar que o sonhador é o outro”, “que o face a face inventa a
linguagem”; e finaliza com “Sabe que em russo ‘câmera’ significa prisão?”. Assistido
durante o Festival de Toronto 2014. Recomendado.