Crítica: 14 Estações da Cruz

Por Fabricio Duque

“14 Estações de Maria”, traduzido de “Stations of The Cross”, exibido no último Festival de Berlim 2014, é uma pequena obra-prima que mescla a estrutura cinematográfica de Lars von Trier (de “Dogville”), Thomas Vinterberg (“Festa de Família” e Michael Haneke (“A Fita Branca”), ao se apresentar com uma irônica e direta realidade minimalista e pouco movimento da câmera. Assim, como já acreditava o diretor português Manoel de Oliveira, aqui foi mitigado o elemento ilusório e se corroborou a essência da clássica estética fílmica. A câmera estática, em plano sequências de poucos cortes, mostra uma “aula religião” (para Crisma) sobre “guerreiros de Cristo”, que fazem “sacrifícios” e “lidam” com a intolerância dos pais na criação (a felicidade programada nas fotos), particularmente em torno de Maria. A narrativa, contada por capítulos, apresenta-se como uma encenação simétrica, que critica a hipocrisia da rigidez familiar, que por sua vez usa a crença das “falhas de Jesus” pela perspectiva radical, gerando consequências comportamentais como bulimia e anorexia, como forma de punição e ou de aceitação quase “Opus Dei”. Entre protestos de “A Hóstia mata Deus” e medidos pedindo ambulâncias, o longa-metragem alemão, dirigido pelo bávaro Dietrich Brüggemann (de “Corra Se Puder”) é composto por quatorze planos, cada um correspondente a um momento da vida da protagonista estreante, Lea van Acken, em paralelo com a Via Crúcis percorrida pelo “Filho do Homem”, que na verdade passou por 15 etapas, sendo a última delas a ressurreição, e que questiona o “abuso na Igreja” e o simbolismo paralelo (do caixão branco, puro e seco) da personagem principal com o sofrimento do “Senhor” que acredita. No final, mais uma metáfora: a câmera finalmente se movimenta, dando a entender que a liberdade foi “generosamente” encontrada e que a “tragédia salva”. Dividida em dois mundos, qualquer coisa que Maria faça ou pense deve ser examinado por Deus, o que a deixa com um medo constante de cometer algum pecado. Preocupada em agradar a todos, a menina (de insinuante beleza física) logo se vê em meio ao fogo cruzado: como conciliar seus sentimentos pelo colega de classe com seus votos de pureza em nome de Deus? “Kreuzweg”, no original, “Estações da Cruz”, venceu o prêmio de roteiro no Berlinale 2014 para Dietrich Brüggemann e sua Irmã Anna Brüggemann, totalmente merecido por mitigar completamente o melodrama. Recomendado.