Crítica: Livre

"Eu perdi minha mãe de câncer há três anos, então é claro que eu me relacionava com o tema. Eu chorei feito um bebê quando li o livro e disse: 'Sim, eu vou fazer esse filme e realmente prestar homenagem a minha mãe que tinha um forte caráter feminino. O livro permite a um diretor se divertir com a linguagem, a edição, os flashbacks, as paisagens, a música, a narração. Por isso, foi interessante fazer esse projeto, que era bonito em sua essência”, disse o diretor Jean-Marc Vallée. 

Por Fabricio Duque

Um dos argumentos mais controversos da cinematografia é constantemente pautado na ideia de que é o gênero comercial (termo extremamente genérico) que influencia a realização de um filme, por seus gatilhos comuns previsíveis, e não o contrário. Não, não é. Na verdade, quando se opta pela estrutura “Mainstream”, logicamente características intrínsecas deste estilo (edição ágil, conteúdo palatável e indução ao politicamente correto do final feliz) precisam ser utilizadas, sendo assim elementos unicamente consequenciais. Só que ultimamente, o espectador pode perceber um hibridismo ao mesclar abordagem conceitual do independente com o querer contraditório do comportamento “Blockbuster”, tendo Hollywood como parâmetro indicativo de sucesso “cúmplice” e unilateral. Nada contra. É apenas mais uma opção de gênero. O que incomoda é a pretensão do querer os dois mundos. O filme “Livre”, tradução brasileira de “Wild, é um exemplo real desta permanência “lúcida” no “limbo”, não sendo um (Sundance) tampouco outro (Oscar), alimentando excessos de sentimentalismos, infinitas liberdades poéticas, existencialismos não sinestésicos e melodramáticos, acasos “amigos”, limites aceitáveis ao sofrimento, manipulação à emoção, descrédito com ações (e reações) apresentadas, flashbacks explicativos dos acontecimentos resumidos do passado, universo politicamente correto coloquial, atualidade sem senso de humor e transposição referencial de outros filmes livremente inferidos. Seu diretor, o canadense Jean-Marc Vallée, demonstrou uma qualidade superior quando realizou os cultuados “Crazy – Loucos de Amor” e “O Clube de Compras Dallas” – com o excepcional Matthew McConaughey – e com inúmeros prêmios internacionais, incluindo o Oscar. Portanto, a tendência ansiolítica do espectador e esperar um novo “sucesso”. “Livre”, baseado no livro “Livre - A Jornada de Uma Mulher Em Busca do Recomeço”, de Cheryl Strayed (mesma personagem de Reese) aborda uma história de recomeço de uma vida e adaptação de se comportar socialmente pelo viés da autoajuda. Jean-Marc Vallée é um diretor de atores, permitindo que cada um assuma totalmente a responsabilidade por suas interpretações, os respeitando nos tempos cênicos. Aqui, escala a “vítima” da vez Reese Witherspoon e “tenta” ajudá-la em “regastar” sua carreira do “ostracismo”. A atriz de “Legalmente Loura” busca curar sentimentos sôfregos causados pela morte de sua mãe, por um divórcio “amigável” e por uma fase de autodestruição repleta de heroína e sexo promíscuo, experimentando terapeuticamente uma nova vida junto à natureza selvagem e confrontando com “desistências” e o peso da mochila – o que realmente um ser humano precisa. Para tanto, ela se aventura em uma trilha de 1100 milhas pela costa do oceano Pacífico conhecida como "Pacific Crest Trail", da fronteira com o México até o Canadá. A jornada alude a Santiago de Compostela de Paulo Coelho, a “Na Natureza Selvagem” de Sean Penn e “127 Horas” de Danny Boyle. Definitivamente, o longa-metragem, que causou paixões e ódios no Festival de Toronto, não convence (apesar da música de Portishead) talvez pela mitigação da possibilidade de se concatenar individualmente as induções, e pela exacerbação dos desafios “fáceis”, da narração mental “pensativa” e pela infantilidade de perder os medos e “virar um lobo”. Concluindo, um filme “mamão com açúcar”, frágil e de ingenuidade amadora.