Crítica: A Gatinha Esquisita

Por Fabricio Duque
Festival do Rio 2013

“A Gatinha Esquisita” apresenta-se como uma espirituosa fábula sobre os encantos que a rotina pode reservar. A narrativa tem tempo de Wes Anderson com Aki Kaurismaki, traduzindo ações quase “autistas” e “chapadas”. Seus personagens observam e contam histórias que são encenadas, dentro de uma fotografia alaranjada, que busca uma nostalgia incompreendida de “O branco é leve”. A trama de uma família exótica condiciona a naturalidade de ações cotidianas. O humor negro, suspendendo o tempo, é visto como um teatro realista proposital (ações físicas e coreografia naturalista), principalmente pela câmera fechada. Os mais simples gestos familiares ganham aos poucos contornos absurdos, em uma referência explícita a Robert Bresson, trabalhando mais o exterior que o interior. O gato intuitivo personifica o elemento lúdico de um conto de fadas. O som contempla o complexo e traduz o invisível. Um filme no mínimo curioso e extremamente interessante. 

Poderia ser um sitcom americano, não fosse tudo tão surreal. Em um apartamento em Berlim, uma família se reúne para uma tarde de rituais prosaicos: uma conversa em torno da mesa de jantar, o conserto de uma maquina de lavar ou pequenos reparos, como pregar um botão que foi deliberadamente arrancado. Em uma cadeia de ações e reações cuidadosamente encenada, os mais simples gestos familiares ganham aos poucos contornos absurdos, em que até animais e objetos desempenham novos papéis. Uma espirituosa fábula sobre os encantos que a rotina pode reservar. Festival de Berlim 2013.