Por Fabricio Duque
Exibido no Festival de Cannes do
ano passado, na mostra Um Certain Regard, “O Médico Alemão” é dirigido pela
diretora Lúcia Puenzo (de “XXY”, “A Prostituta e a Baleia”, “O Menino-Peixe”),
que baseou o filme no livro de sua autoria “Wakolda”. O tema representa um
período sombrio na história da Argentina, não apenas pela presença do médico
nazista Josef Mengele (cientista nazista que realizou experimentos com humanos
no campo de concentração de Auschwitz) no país, mas também como a própria comunidade
alemã de lá, que sabia com quem lidava e colaborou para sua clandestinidade. A
narrativa utiliza-se, quase explicitamente, da atmosfera do diretor alemão Wim
Wenders, principalmente em seu filme “O Amigo Americano”, imprimindo um
suspense de amoralidade consentida, resgatando com a fotografia a credibilidade
de uma época (repetindo sem copiar até os ângulos da cinematografia alemã nos
anos sessenta – período abordado). “Não há nada mais misterioso que o sangue”,
diz-se quase como um resumo do conteúdo totalitário. Em se tratando de
medicina, as experiências (intrínsecas aos profissionais envolvidos) são comuns
e necessárias para que se possa atestar a eficiência. O nazismo “recrutou”
vítimas de forma mandatória e sem opção de desistência. Alguns casos obtiveram êxito,
exemplo dos casos deste filme. A diretora transpassa prós maniqueísmos e a
sensação que fica ao espectador é de estar, de certo modo, concordando com o
médico, já que o apresenta agradavelmente, apenas com interesse científico,
tentando, vez ou outra, sutis inferências à pedofilia, ou explícitas (bullying escolar), mitigação da
desconfiança alheia e solidariedade exacerbada e sem ressalvas. Com finais
esperados (sem spoilers claro), o longa-metragem está longe de ser
desinteressante. Seu ritmo, tempo narrativo, internas interpretações
(dizendo-se muito mais no silêncio) e a “tranquilidade” em construir a trama,
tudo faz com que “O Médico Alemão” merece ser assistido. E logo.