Crítica: Caravaggio

Por Fabricio Duque

“Caravaggio” representa a visão do diretor britânico Derek Jarman (de “Sebastiane”, “The Angelic Conversation”) sobre a vida d e Michelangelo Caravaggio, conhecido por Michelle, renomado artista do Renascimento. Uma das características marcantes da cinematografia de Derek é a forma como traz ao mundo presente uma exata atmosfera temporal da época passada. A direção de arte reconstrói com precisão o período romano, soando como um documentário ficcional de teatro vivo, crédulo, encenado, naturista e com máxima preocupação da imagem, retratando-se como bastidores de uma obra de arte. O roteiro, escrito por Derek, corrobora sua “liberdade” criativa de trabalhar com excentricidades e “depravações” sem pudores como intrínsecos sentimentos dos seres humanos. A narrativa busca referência no estilo de “neo” realismo italiano (cortes secos, elipses, passionalidade interpretativa, experimentações ilimitadas) a fim de construir a credibilidade visual e sinestésica ao espectador. A história insere a cobiça de uma sociedade ávida por dinheiro, que tem na Igreja (de riqueza ostentada e “divina”) o espelho do autocomportamento. Filhos vendidos, mulheres compradas, sexualidades transformadas, moral deturpada, tudo é permitido por moedas de ouro. São sobreviventes da própria estrutura social que os moldou. Derek consegue mitigar o clichê tão característico em um gênero deste. A biografia romanceada é despertada pelo desejo visual, das insinuações sexuais, da “expansão” de se querer mais sem o julgamento perturbador. É inevitável não relembrar os filmes de Peter Greenaway, Frederico Fellini e “Um Bonde Chamado Desejo” (por exacerbar os “dotes” físicos do objeto de desejo – como Marlon Brando molhado na chuva com Sean Bean (de “Game of Thrones”) sujo de graxa na moto – seria caricato se não fosse o olhar atento de Derek). “Caravaggio” (protagonizado por Nigel Terry, de “Tróia”) escala a atriz Tilda Swinton , pela primeira vez (que vira presença obrigatória nos seus filmes). Aqui, sua estética floresceu. São representações explícitas de amor homossexual, ambiguidade narrativa e gráficos magníficos, especialmente as representações ao vivo de Caravaggio em suas pinturas mais famosas, narrado por poemas realistas que criam a metáfora com o que está sendo abordado em tela. Concluindo, um filme, que ganhou o Urso de Prata (Aspecto Visual) no Festival de Berlim 1986, e que merece ser assistido.