Crítica: A Menina Que Roubava Livros

Por Fabricio Duque

“A Menina Que Roubava Livros”, adaptado do livro homônimo de Marcus Zusak, integra o gênero de literatura no cinema, com características novelescas traduzidas em tela por elipses capituladas. A narrativa utiliza-se da linguagem televisiva em planos, contraplanos e no próprio conteúdo abordado, talvez pela experiência do seu diretor Brian Percival com “Downton Abbey”, assim podemos perceber os elementos característicos de melodrama (manipulando a emoção do espectador com a música de efeito que “explode” nas cenas mais trágicas) e de rapidez na forma de se contar a história (abusando dos gatilhos comuns para equilibrar as engrenagens do roteiro). Então, entende-se melhor o grau de superficialidade usada, de transpor apenas as partes mais óbvias (e mais relevantes) da trama, mitigando o aprofundamento necessário para a construção do enredo. 

Por exemplo, no livro os pormenores vivenciados pela protagonista ajudam o melhor entendimento da época da guerra (o antes, o durante e o depois). Pedindo licença por um spoiler (mínimo e já possivelmente divulgado), a história é contada pela Morte. Os cinéfilos mais engajados irão referenciar ao filme “O Sétimo Selo”, de Ingmar Bergman, ao livro “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, de Machado de Assis, ao filme “Beleza Americana”, de Sam Mendes e ao livro “Intermitências da Morte”, de José Saramago. A estratégica deseja unir o realismo inevitável com a suavização poética da sobrevivência. Aqui, o pano de fundo é a saga ingênua de uma menina – adotada por um casal pobre, porém a frente de sua época, que buscava “refúgio” na fantasia literária, a fim de transpassar uma resiliência dos conhecimentos pré-adquiridos. Seu crescimento experimentou os horrores de um período que parecia não ter salvação, tampouco fim. Optou-se pelo amadorismo do tema amor, como um compêndio cristão mesclado com o otimismo da (auto) subserviência da incondicionalidade. Trocando em miúdos, o roteiro apela ao extremo sentimentalismo para “conquistar” os corações do público. A tentativa transforma-se em um retrato piegas, sem indicar qual o lado do muro é mais importante. Mas se analisarmos o gênero escolhido, entenderemos que estas características são presentes e naturalmente intrínsecas.

 Indo um pouco mais longe, é um filme para o Oscar, para emocionar plateias familiares, para fomentar a felicidade de sentir a vida viva. Esta última frase denota a real atmosfera do que se espera: um longa-metragem feito para extrair lágrimas com efeitos dramáticos ao ápice da moralidade maniqueísta e unilateral. Nem tudo são espinhos. No livro, a mensagem, contra o nazismo, mostra que mesmo a pobreza não retira boas ações. No filme, tentando uma transposição mais fidedigna, a mensagem é conservada, mesmo com os desígnios irremediáveis da Morte que “leva” prematuramente a inocência. Concluindo, um filme que atende aos espectadores de odisseias literárias, que não se importam com manipulações sentimentais. Questione-se. O filme poderia ter sido realizado de outra forma? Dos produtores de “As Aventuras de Pi”, de Ang Lee.