Por Fabricio Duque
“Exilados do Vulcão”, quando foi
exibido, representou a sessão mais concorrida e badalada da V Semana dos
Realizadores, talvez, pelo fato do filme ter saído vitorioso com o prêmio
máximo no último Festival de Brasília. A diretora Paula Gaitán, mãe de Eryk
Rocha (de “Rocha Que Voa”, “Transeunte”) e viúva de Glauber Rocha, “pai” do
Cinema Novo, , encontrou no gênero de autor sua prolixa maestria, com planos
longos e contemplativos, cenas silenciosas versus “roqueiras”, que imprimem o
tempo da espera como um recurso sinestésico e personalizado, emolduradas por
uma fotografia (Inti Briones) de poesia visual, árida, de brilho pela
localização do sol, de nostalgia “roubada” (do personagem que se vê). O
longa-metragem constrói período por período tentativas rítmicas, buscando o equilíbrio
narrativo como uma referência metalinguística do próprio processo de criação.
Inicia-se com ações rápidas, encenadas propositalmente (de ir direto ao ponto,
mesmo dentro de um tempo pausado), com narração em fade e extensão do olhar
perceptivo, conduzindo a uma estrutura (e tempo) editada (o), mas não lento
(a). O naturalismo teatral reverbera sensações, reflexos, ventos e feixes de
luz, experimentando estéticas como a névoa que encobre a visão. A câmera
torna-se personagem, buscando os porquês da atmosfera de suspense e de prisão aflitiva
que se apresenta.
O que vemos é a personificação de sentimentos e espelhos
metafóricos, mostrando aos poucos certas peças do quebra-cabeça. Neste momento,
sem perceber, o espectador já se encontra embarcado na aventura existencial da
diretora, que por sua vez, gera o direcionamento em linha reta (no limite tênue
entre tempo e ação). Assim, o roteiro conta sua história com projeções e
lembranças, complementada pela trilha sonora pontual da música “Don´t Explain,
por Billie Holiday, ou de Cat Power ou do silêncio absoluto. “Perder a memória
é diferente de esquecimento”, diz-se entre epifanias temporais. Não há como
desvencilhar o tempo, que é um explícito elemento narrativo, intercalando
épocas do embate juventude versus velhice. É transpassada a construção de uma
existência. O respiro mais cansado. O intenso. O passado. O sexo extremamente
alto ao som de uma música de rock indie eletrônico. Paula homenageia o cineasta
iraniano Abbas Kiarostami quase em toda duração do filme (pelos ângulos de
câmera, pelo detalhe do livro e pela quebra da narrativa).
Há inserção de
camadas e subcamadas psicológicas, como o passado fantasmagórico (de aparição
holográfica projetada) que ronda defesas, resignações, explicações,
libertações, limites, os quereres utópicos (simples e ultrapassados) e estágios
da vida. Desdobramentos (e afetações) de uma única vida na vida de outros são
mostrados. A linguagem prolixa, verborrágica (inversamente ao barulho),
incompreendida e estrangeira disseca faltas, presentes em indivíduos coletivos,
que são únicos, mas que precisam de outros para que possam existir. A diretora
Paula Gaitán não facilita mesmo. Leva o filme inteiro dando dicas homeopáticas.
Com isso, preza pelo respeito à inteligência do espectador, que não recebe
pronto (nada mesmo). O filme é dedicado a Uma Gaitán e é baseado em “Sobre a
Neblina”, de Cristiane Tassis. Filmado em Araponga e Belo Horizonte em 2011. Não
Perca!