Crítica: Amor, Plástico e Barulho

Por Fabricio Duque

“Amor, Plástico e Barulho”, exibido na V Semana dos Realizadores, discursa sobre o gênero brega de ser, tanto na música, quanto na influência do comportamento social deste público. “É uma visão pessoal de uma realidade brasileira contemporânea de como sobreviver com o brega”, disse a diretora Renata Pinheiro, estreante em um longa-metragem. O roteiro ficcional busca retratar regionalismos, identificando elementos típicos e a figura dos “amores plásticos”, que se conta por apresentações de dançarinas que objetivam vidas melhores (oportunidades). A pensão residencial; o brega show; a roupa sexy colorida e excessivamente brilhosa; a figura trash (e de popularidade inversa) da televisão como sucesso; o sexo como interesse de “subir” na vida (ganhando privilégios) e como forma de “aliviar” o tesão; a pressão (ansiedade) defensiva; a raiva limite (gerando brigas, invejas (de querer o “lugar ao sol” alheio) e competições); a resignação (quando se descobre que “aquilo é aquilo mesmo”), estas são consequências de uma sobrevivência necessária, elevando a máxima de que “os mais fracos são engolidos pelos mais fortes”.  

“Sonhos não morrem, apenas adormecem na alma da gente”, diz-se, parafraseando Chico Science. O espectador detecta inúmeras referências fílmicas. “Bruna Surfistinha”, “Rânia”, “Vou Rifar Seu Coração”, “Doce Amianto”, “Aprendi a jogar com você”, de Murilo Salles sobre a família do DJ Duda. A narrativa procura o equilíbrio interpretativo e a ação insinuada do realismo, mas encontra quebras no ritmo (talvez por ingenuidade, pressa e ou amor incondicional). A briga da protagonista com o namorado logo no início do filme revela amadorismo; assim como o gatilho comum da traição à construção de um conflito rápido demais desencadeiam a caricatura e o clichê. Incomoda porque percebemos a total entrega dos atores, que seguram competentemente a trama nas costas, dividindo espaço com uma parte técnica impecável (fotografia, câmera, som). Outro recurso destoante é a inclusão de imagens de televisão digital (aparecendo distorcidas), como lixo no mar e propagandas comerciais. A protagonista “musa do brega” diz sobre o próprio corpo “todo natural” (“o que é bonito é para se mostrar”). Aos poucos, desperta-se um insight. Percebemos que o roteiro comporta-se como a estrutura de uma música brega, com suas brigas (e traições) dramáticas. Mesmo os contras de “Amor, Plástico e Barulho” não tiram o interesse do público pela escolha, principalmente por causa de momentos antológicos. O ator de “Tatuagem”, Rodrigo Garcia; a versão capela de “Chupa Que É de Uva” (com sofreguidão e lágrimas); quando “descobrem” que “o sucesso é descartável”; a decadência; a labirintite (“doença da noite”); o submundo; a sutileza do olhar; o surto enlouquecido e projetado do “glamour” (criando-se um mundo próprio e auto-manipulável). 

A busca de cada um intensifica o subjetivismo, alterando-se até mesmo a verdade. Fantasia ou realidade? Projeção ou desejo? Querem o “amor vagabundo que vem lá do meu bem”? Com a chuva de purpurina em “perfomances” em um ônibus. Concluindo, um filme que mostra o “mais”, o excesso, como recurso narrativo para que assim personificar o gênero over do brega. Perde-se ritmo, referências são repetidas, mas se ganha nos instantes (quase solos) dos atores (contextualizando um “pró” aceitável e com vontade de assistir). “Situando geografia física e humana em uma camada sensorial e experimental construo meu trabalho. Sobre as imagens de internet, as utilizei para situar a história geral. É o Brasil de hoje, mais sujo, que não se vê tanto na mídia, com excesso de informação e poluição visual e sonora. Quis mostrar pessoas normais, que numa vida precária, num palco com brilho falso, viram estrelas. É um musical Brasil”, finaliza a diretora. Recomendo. O longa-metragem ganhou o prêmio de montagem no Festival Janela.