Crítica: O Nascimento de Uma Nação

O Nascimento de Um Cinema

Por Fabricio Duque

“O Nascimento de Uma Nação” representa uma visão muito peculiar do diretor americano David Llewelyn Wark Griffith, conhecido por D. W. Griffith (22 de Janeiro de 1875 – 23 de Julho de 1948), um dos participantes do início da cinematografia, inovando na forma de fazer cinema, sendo considerado o criador da linguagem cinematográfica, gerando elogios do cineasta russo Sergei Eisenstein (de “O Encouraçado Potemkin”) no livro "A Forma do Filme", no capítulo "Dickens, GRiffith e nós", no qual compara a técnica de Griffith a técnica do escritor Charles Dickens, por transformar sombras, luzes, câmeras detalhes em concretismo visual. 

O diretor foi o primeiro a utilizar dramaticamente o close, a montagem paralela, o suspense e movimentos de câmera. Experimentando-os em 450 filmes curta-metragens entre 1908 e 1913. “O Nascimento de Uma Nação” é seu primeiro longa-metragem, despertando a crítica “segmentada” de negros versus brancos. É um filme mudo, rodado em 1914, e exibido um ano depois em oito de fevereiro, sendo baseado no romance e na peça “The Clansman”, ambas de Thomas Dixon. Era originalmente apresentado em duas partes, separadas por um intervalo e possui quatro durações: 165 min | 125 min (video) | 187 min (DVD) | 190 min, esta última a versão assistida pelo Vertentes do Cinema. 

Foi o primeiro filme na história a ultrapassar os 100 minutos de duração. Mas não é pela parte técnica (a frente do seu tempo) que a película em 16mm cria suas limitações e aceitabilidades. E sim pelo contexto unilateral e subjetivo de uma visão social defendida como “protetora” e “saudável”. O filme foi banido de inúmeras cidades, incluindo Los Angeles (Sul), e mesmo com comportamento racista, estreou em Nova York (Norte) com os ingressos custando US$ 2 (caro para a época), permanecendo um ano em cartaz e levando mais de um milhão de pessoas aos cinemas. Sendo o primeiro filme a ser exibido na Casa Branca, para o Presidente dos Estados Unidos Woodrow Wilson (considerado pai do idealismo; lutou por uma Alemanha livre e com condições para um desenvolvimento econômico e democrático; e também por suas convicções racistas: reduziu bruscamente a participação de negros na política em muitos estados dos EUA, apesar de apregoar os Direitos Civis em sua campanha). As ideias do presidente, principalmente no livro “A História do Povo Americano”, estão no filme em questão aqui, “pôr ao sul branco sob a bota do sul negro”. 

“O Nascimento de Uma Nação” diz ser “Uma apresentação histórica da Guerra Civil e do Período da Reconstrução”, que “mostra os horrores da guerra como desprezíveis” e que “crítica o erro sem se incomodar com a censura”. O filme reverbera o adjetivo ofensivo logo nos primeiros créditos textuais: “Quando trouxeram os primeiros africanos a América, plantou-se a primeira semente da desunião”. Como já foi dito, o que incomoda é viés da crença social de cada um. Griffith cria sua novela, no gênero autoral comum à época, influenciando, explicitamente, a estrutura do filme “E O Vento Levou...”. E se expressa pela fábula “ariana”, dramatizando o assassinato do presidente Abraham Lincoln.  Altamente criticado por retratar os afro-americanos (interpretados por atores brancos – caricatos – com as caras pintadas de negro – Black faces) como ladrões de votos, sem inteligência (animais irracionais – bebendo e colocando os pés na cadeira no meio de uma sessão legislativa), sexualmente agressivos em relação às mulheres brancas, maldosos, debochados, quase monstros, buscando a superioridade negra (o “racismo inverso”), contra “os homens brancos (a minoria branca indefesa), que se mantinham por um mero instinto de autoconservação”. 

A salvação (ou “inspiração”) é fundar a organização Ku Klux Klan, uma “força heroica” e “um verdadeiro império para proteger o país sulista contra a anarquia dos negros”. “O Grande Radical” busca igualdade total de brancos e negros, “dirigindo” o poder do voto negro no sul, como uma “caridade do norte”, enganando os “ignorantes”. Uma negra do sul (que se acha branca) diz “Esses negros livres do norte me deixam louca”. Isso era em 1915. “A anarquia dos ideais esmagados” e “O leão social da nova aristocracia” são frases impressas, conduzindo à manipulação das ideias abordadas. “Os antigos inimigos do norte e sul se unem em defesa comum de seu direito ariano de nascimento”, diz-se, ou melhor, escreve-se. Silêncio. Isso em 1915. A apresentação narrativa faz com que o espectador “clame” pela KKK para que a cidade, “os brancos indefesos” e a “donzela” sejam salvas da “praga negra”. 

O filme é creditado como um dos eventos responsáveis pelo ressurgimento da Ku Klux Klan em Stone Mountain, Geórgia, no mesmo ano em que foi lançado. Usado como ferramenta de recrutamento até meados da década de 1970. O "Guia Ilustrado Zahar Cinema", de Ronald Bergan, diz: "Marco no desenvolvimento da história do cinema, é até hoje um dos filmes mais controversos. As inovações anteriores de Griffith, cortes intercalados, closes, dissolução e fusões, aqui amadurecidos, juntaram-se a integração de relato íntimo e sucessão de eventos históricos reconstruídos: o assassinato de Lincoln e grandes massas de soldados em batalha". 

Concluindo, pode ser ofensivo, pode ser racista, pode ser radicalmente subjetivo e autoral, mas em hipótese alguma podemos desmerecer a importância histórica e cinematográfica (como base da criação da indústria de Hollywood). Charles Chaplin chamou o Griffith de "O professor de todos nós". John Ford trabalhou em "O Nascimento de Uma Nação". Em 1953 o Directors Guild of America instituiu D. W. Griffith com o prêmio mais importante , mas o conselho nacional do DGA—sem consultar os membros (o que não é legalmente necessário)—anunciou que o nome do prêmio seria modificado para o DGA Lifetime Achievement Award, porque o filme do Griffith O Nascimento de Uma Nação teria "cultivado estereótipos raciais intoleráveis". Os seguintes ganhadores concordaram com a decisão da corporação: Francis Ford Coppola, Robert Altman, Sidney Lumet e Robert Wise. 

O filme relata as vidas de duas famílias durante a Guerra de Secessão e a subsequente Reconstrução dos Estados Unidos – os Stonemans, nortistas pró-União e os Camerons, sulistas pró-Confederação.