Contra a Chapinha
Por Fabricio Duque
A animação da Disney “Valente”
versa sobre a busca do verdadeiro destino que se encontra dentro de cada um de
nós. Não há metáforas especificas, mas sim a generalidade de um contexto
desafiador, questionador e libertador. Ser o que é, não importando as
consequências e ou o julgamento dos outros (pessoas que “sofrem” da mesma
ditadura social de agradar a tudo e a todos, mesmo sem o entendimento
necessário sobre as coisas. Assim, a maioria segue regras impostas, quase
impossíveis, a fim de perpetuar o elemento aristocrático da elegância e das
boas maneiras. No filme em questão, a “Princesa” protagonista luta com os
quereres confusos de seus familiares, amigos e “inimigos” para que possa
vivenciar plenamente a essência de sua vida. É compreensível que o espectador
tenha uma “resposta” a própria questão existencial. O que a Disney proporciona
é projetar a possibilidade de liberdade, criando inúmeras opções de finais
felizes por meio da fantasia. Digamos que aqui, há a personificação das intrínsecas
idiossincrasias, podendo ser uma mistura de Fiona, do Shrek, com o “Amigo
Urso”. Porém são apenas referências por causa dos elementos escatológicos e
fisiológicos que todos fazem, mas não assumem, como flatulências e arrotos.
Como disse, cada um assiste ao filme de uma forma. Essa é a beleza da
subjetividade. É inevitável “brincadeiras” em relação ao cabelo crespo e ruivo,
sem a utilização da “chapinha”, ou a bravura masculina que pode induzir outra
percepção. Mas não, não é um filme gay. Está longe disso. A trama deseja
transpassar que podemos romper as imposições de uma mãe “modelo”, e que nem
todas as mulheres foram “criadas” para trabalhos domésticos e de “menininha”
como corte e costura, sem que isso faça da nossa personagem principal uma lésbica.
Merida (Keely Macdonald) é uma
habilidosa e impetuosa arqueira, filha do rei Fergus (Billy Connolly) e da
rainha Elinor (Emma Thompson). Determinada a trilhar o próprio caminho, ela
desafia um antigo costume considerado sagrado pelos ruidosos senhores da terra:
o imponente lorde MacGuffin (Kevin McKidd), o carrancudo Lorde Macintosh (Craig
Ferguson) e o perverso lorde Dingwall (Robbie Coltrane). Involuntariamente, os
atos de Merida desencadeiam o caos e a fúria no reino e, quando ela se volta
para uma velha feiticeira (Julie Walters) em busca de ajuda, tem um desejo
mal-aventurado concedido. Os perigos resultantes a forçam a descobrir o
significado da verdadeira valentia para poder desfazer o brutal curso dos
acontecimentos, antes que seja tarde demais.
A história passa num reino
antigo, na civilização Viking, recheado de músicas celtas, conduzindo o
espectador aos mais básicos instintos. Na verdade, o roteiro é sobre
transformação, visualizar-se internamente de outra forma, permitir que a
mudança possa ocorrer. Quando um feitiço de uma bruxa “desastrada” intensifica
a essência adormecida do que se realmente é, então a aventura pela
simplificação do complexo inicia a trajetória da verdade. Quanto à narrativa,
corrobora-se o classicismo. Há a apresentação dos personagens (e dos
sentimentos), há o embate, há a “suposta” e “infantil” resolução, há a luta
pelo erro e há o final feliz, utilizando-se de “sacadas” perspicazes e
sutilezas na condução interpretativa. A história humaniza o que cada um pode
ter de ruim, explicando que não há o lado negativo e sim respeitando o que se
encontra no íntimo dos outros próximos. Concluindo, é um filme, que merece ser
visto, pois resgata o que se perde a cada dia: a simplicidade do ser, sem a
necessidade de “inventar” um “outro eu”, para que o outro sinta menos a própria
presença. Sim, é filosófico e extremamente perturbador quando olhamos para nós
mesmos. Recomendo.