A Dançarina e o Ladrão

Ficha Técnica

Direção: Fernando Trueba
Roteiro: Fernando Trueba, Jonás Trueba, Antonio Skármeta
Elenco: Ricardo Darín, Abel Ayala, Miranda Bodenhofer, Ariadna Gil , Julio Jung, Mario Guerra, Marcia Haydée, Luis Dubó, Luis Gnecco, Mariana Loyola
Fotografia: Julián Ledesma
Edição: Carmen Frías
Figurin: Lala Huete
Direção de Arte: Verónica Astudillo
Produção: Jessica Huppert Berman
Distribuidora: Paris Filmes
Estúdio: Fernando Trueba Producciones Cinematográficas S.A.
Duração: 127 minutos
País: Espanha
Ano: 2009
COTAÇÃO: ENTRE O BOM E O MUITO BOM



A opinião

“A Dançarina e o Ladrão”, tradução oficial brasileira do ao pé da letra “O Baile da Victoria”, traz no elenco um dos maiores atores argentinos da atualidade, Ricardo Darín, e conduz a narrativa por metáforas detalhistas e pela personificação figurativa do amor puro e incondicional, extremamente nostálgico por ser incompreendido pelo estado do mundo nos dias de hoje, visto que chega a soar utópico, a arte de se amar pela essência. Este foi o filme escolhido pela Espanha para buscar uma vaga de indicação ao Oscar 2010 de Melhor Filme Estrangeiro, e o seu responsável, Fernando Trueba, aclamado diretor, de “A Garota dos Seus Sonhos”, já ganhara, em 1993, o Oscar por "Belle Époque", portanto, o cineasta deve saber que seus filmes têm aceitação rara, tanto de público comum, especializado e dos membros da Academia. A mensagem por trás do tema abordado é a sobrevivência do individuo social, como parte integrante do povo, convivendo com as desigualdades, desconfianças, individualismos, subjetivismos, egocentrismos, hipocrisias, preconceitos adquiridos, críticas projetadas dos outros que complementam o meio o qual os protagonistas vivem, referenciando ao faroeste moderno. O pano de fundo político, apenas, incrementa o roteiro, fornecendo consistência contextual à trama. Com o advento da democracia, o presidente do Chile, após a saída do ditador Augusto Pinochet do poder, decreta anistia geral para todos os presos.


Entre eles estão o jovem Ángel Santiago (Abel Ayala, de “El Polaquito”, “Hermanas”), sonhador, de empolgação adolescente, ingênuo, imperativo, utópico; e o veterano Vergara Grey (Ricardo Darín, de “O Segredo dos Seus Olhos”), realista, desencantado, seco, frio, resignado com as ações consequentes, e um famoso ladrão de caixa-forte. Os dois têm planos opostos: enquanto Grey quer apenas recuperar sua família, o jovem pensa em dar o grande golpe. No caminho da dupla aparece Victoria (Miranda Bodenhöfer), que transforma a vida dos dois. É um filme extremamente metafórico, que busca na sutileza dos elementos para personificar a mensagem abstrata. Logo no título original, podemos perceber isso. O baile da Victoria é uma “homenagem” aos anistiados, ao fim da ditadura, ao começo da liberdade, e como contradição, a falta de tempo a fim de absorver importantes informações, a mitigação do amor puro e automaticamente o amadurecimento do efêmero. “É velho, mas aquece bem”, diálogo sobre um cachecol entre o diretor da penitencia com o jovem protagonista, transpassando certa intimidade. O roteiro objetiva a naturalidade interpretativa, que está presente tanto no cinema espanhol, quanto no argentino, e observamos a união das duas, definindo como um exagero contido, um drama permitido e um realismo de poesia bruta, transpondo às telas o estudo do comportamento social, revisitado analogicamente em épocas, contrastando por uma atemporalidade datada, trazendo e “impondo” valores (e costumes) passados a outro momento histórico. Poesia, por sua vez, será uma palavra usada de forma recorrente aqui, como por exemplo, na cena em que a dança acontece, mostrando que palavras não são importantes para que o conhecimento e o envolvimento ocorram. O casal jovem comporta-se como dois desajustados que trocam afinidades, sendo captados pela fotografia noir com cores e por ângulos estilizados de câmera.


Esse passado pode ser representado pelo “suposto” ladrão, que acredita que “roubos eram menos violentos” e que as complexas reviravoltas do mundo podem ser resolvidas de maneira bem mais fácil, não dando ouvidos quando escuta “Se houvesse justiça no mundo, ela (Victoria) estaria no Teatro Municipal”. O cavalo na cidade, a felicidade desmedida de molhar os pés no mar, a música “My Way” e o mesmo cavalo na beira do mesmo mar intercalam o estado deslocado de ser e de existir. Baseado em livro de Antonio Skarmeta (de “O Carteiro e o Poeta”), o longa-metragem experimenta narrativas, emoções, “asas”, “ilusões”, a perda da inocência, o tango passional (“Youkali Tango” Coreografado por Georgette Farías), o balé clássico, a reação aflitiva. Concluindo, um filme que merece ser assistido, não apenas pela presença de Ricardo Darín, que interpreta as emoções pelo simples ato do olhar, e pela do diretor, que consegue extrair sensibilidade poética regada ao realismo. Mas também pela parte técnica, pelos outros atores, como Ariadna Gil (de “Labirinto do Fauno”) e pela magnitude da transposição do roteiro. Ganhou os prêmios Goya 2011 de Diretor (Fernando Trueba), Ator Coadjuvante (Ricardo Darín), Roteiro Adaptado (Fernando Trueba, Antonio Skármeta, Jonás Trueba), Figurino (Lala Huete), Edição (Carmen Frías), Direção de Arte (Verónica Astudillo), Desenho de Produção (Eduardo Castro), Som (Nacho Royo, Pelayo Gutiérrez). As filmagens aconteceram no Chile entre julho e outubro de 2008. Recomendo.

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O Diretor

Fernando Rodríguez Trueba, mais conhecido como Fernando Trueba (Madrid, 18 de janeiro de 1955), é um diretor de cinema espanhol que ganhou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro pelo filme "Belle Époque" em 1993. Iniciou sua carreira como crítico cinematográfico do jornal "El Pais", seu filme de estréia foi Opera Prima em 1980; em 1985 alcançou o sucesso com a comédia "Sé infiel y no mires con quién" com Carmen Maura e Ana Belém. Em 1988 foi o presidente da Academia de Artes Cinematográficas da Espanha e mais tarde foi o autor do livro "Diccionário de Cine". O filme "Belle Époque" além do Oscar, ganhou 9 prêmios Goya na Espanha. Em 2003 a convite do músico Carlinhos Brown veio conhecer Salvador e apaixonou-se pelo trabalho feito pelo músico na favela do Candeal, assim voltou em 2004 quando produziu e dirigiu o documentário "O Milagre do Candeal", segundo ele, "a história de uma favela onde as crianças vão armadas com instrumentos musicais em vez de fuzis". Possui ainda um projeto de documentário sobre o desaparecimento de Francisco Tenório Júnior o Tenório Jr., músico brasileiro vítima da repressão militar na Argentina em 1976. Em 2010 dirigiu o longa-metragem de animação Chico e Rita que também venceu o Goya e foi indicado para diversos prêmios internacionais.


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