Crítica: O Porto

Ficha Técnica

Direção: Aki Kaurismäki
Roteiro: Aki Kaurismäki
Elenco: André Wilms, Kati Outinen, Jean-Pierre Darroussin, Blondin Miguel, Elina Salo, Evelyne Didi, Quoc Dung Nguyen, Laïka, François Monnié, Roberto Piazza
Fotografia: Timo Salminen
Edição: Timo Linnasalo
Produção: Aki Kaurismäki
Distribuidora: Imovision
Estúdio: Pandora Filmproduktion / Pyramide Productions / Yleisradio (YLE) / Sputnik
Duração: 93 minutos
País: França/ Alemanha/ Finlândia
Ano: 2011
COTAÇÃO: BOM



A opinião

Por Fabricio Duque

O novo filme do diretor finlandês Aki Kaurismäki, “O Porto”, conserva suas características cinematográficas, que são recorrentes influências de diretores como Jean-Pierre Melville e Robert Bresson. A história é contada de forma simples e com atuações moderadas a fim de transmitir a mensagem. A definição contextual de seus filmes torna-se difícil pela quantidade diversificada de narrativas e interpretações induzidas. Ora superficial demais, ora apática, ora exageradamente proposital. É um estilo autoral, próprio e único. Os roteiros têm um lado humorístico subestimado e uma crítica, de contraste pretendido, que passeia pelo deboche em tom de seriedade e pelo clichê (objetivado) do não romantismo, conduzindo a uma peça teatral observada pelo silêncio. Assim, o diretor desafia a explorar os elementos de convivência social apenas peã visão sensorial do espectador, como por exemplo, as cenas em que os personagens olham uns aos outros, é perceptível vislumbrar o pensamento, personificado no olhar, de uma construção definidora, podendo ou não ter a primeira impressão preconceituosa, dos “próximos” do convívio cotidiano. Alude-se à forma de Noir francês, principalmente porque retrata pelos detalhes, para que assim possa nortear o universo apresentado. É um filme de dentro para fora, mas sem a participação de quem assiste. Transpassa nostalgia e existencialismo, entre diálogos mecânicos, com os olhos voltados ao infinito quando falam, sem empolgação e fadados ao limite incorporado, por todos, da resignação.

Quando a câmera aproxima, percebemos a imposição explicita do melodrama, sem efeitos e ou músicas apelativas. O espectador está sozinho com sua inteligência e possui total liberdade de formar as próprias percepções, trabalhadas com as vivências de mundo, princípios, éticas e crenças políticas. A fotografia complementa esta atmosfera. É kitsh, usado para categorizar objetos de valor estético distorcido e ou exagerado, saturado em constantes movimentos de sombras. Marcel Marx (André Wilms) é um homem que vive como engraxate nas proximidades do porto Havre, uma comunidade francesa na região administrativa da Normandia e, com o pouco dinheiro que ganha, tenta sustentar sua casa. Vivendo com dificuldades, ele vê sua rotina mudar quando sua esposa (Kati Outinen) subitamente adoece e um garoto africano chega ao país dentro de um cargueiro. Com o auxílio de alguns vizinhos, resolve esconder o menino e encontrar sua família, enquanto tenta despistar o detetive encarregado de localizar o imigrante ilegal. O roteiro busca explanar sobre o tema atual da imposição de se entrar em um país sem os devidos documentos comprobatórios, questionando sobre o que realmente está certo: a lei ou a solidariedade humana. “Sou o albino da família”, diz-se, sarcasticamente, sobre o parentesco de um branco com um garoto negro.

Em outro momento, a câmera focaliza cada rosto, em poucos segundos, que encara a tela, perpetuando o tempo que um tem para observar o outro. “Um homem anônimo é difícil de explicar”, divaga-se. Os imigrantes são vistos e recebidos com descaso. Mas sempre haverá um que burlará o sistema e fará o que acha que é o politicamente correto a fazer, mesmo indo de encontro às regras jurídicas e internacionais. A trilha de filme antigo, um clássico, desvirtua a critica e indica uma salvação, a fantasia de que o mundo de hoje ainda pode mudar. É sóbrio, adulto e crítico ao mesmo tempo, atenuando com metáforas. “Há esperança, doutor?”, “Vou falar como político: sim”, diálogo incrível que pode resumir o contexto. As elipses temporais norteiam mudanças, mesmo com o tom direto, sem plumas, e olhares desconfiados. “Ela é a empresaria da minha alma”, declara-se amor com poesia bruta. O final explicita que o que se vê é o teatro da vida, quando a luz foca o detalhe que se deseja mostrar. A narrativa segue com parábolas, dicas, permitindo pequenas tramóias, para que a ajuda ao próximo possa acontecer, tendo o tango ultra dramático de Carlos Gardel. Concluindo, um filme incrível, estranho na melhor definição da palavra, que traduz o ser humano de forma contida, silenciosa e usando o clichê, como crítica aos atuais problemas das embaixadas. Recomendo. Selecionado como representante da Finlândia para o Oscar 2012 de melhor filme estrangeiro.

"Cada personagem é o porto do outro"

por Marise Carpenter

Belíssimo filme de Aki Kaurismäki. A beleza na verdade está na construção dos personagens e na relação estabelecida entre eles. Através do tema da imigração, o diretor utiliza a fraternidade e a igualdade para compor uma história bem bonita e mostrada com muita arte onde cada personagem é o porto do outro.


O Diretor
Foto: http://indieethos.wordpress.com

Aki Olavi Kaurismäki nasceu em Orimattila, Finlândia, 4 de abril de 1957. começou sua carreira como co-diretor nos filmes de seu irmão mais velho, Mika Kaurismäki. Estudou jornalismo e trabalhou como crítico de cinema. Entre seus filmes destacam-se Os Cowboys de Leningrado Vão para a América (1989), selecionado para o Festival de Berlim, O Homem Sem Passado (2002) vencedor do grande prêmio do júri e do prêmio de melhor atriz no Festival de Cannes e indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro, e Luzes na Escuridão (2006), também exibido em Cannes.