Crítica: Dois Irmãos

Ficha Técnica

Direção: Daniel Burman
Roteiro: Daniel Burman, Sergio Dubcovsky
Elenco: Graciela Borges, Antonio Gasalla, Elena Lucena, Osmar Nuñez, Rita Cortese
Fotografia: Hugo Colace
Montagem: Pablo Barbieri Carrera
Música: Nico Cota
País: Argentina / Uruguai / França
Ano: 2010
Duração: 105min


A opinião

“Dois irmãos” é o mais recente filme do diretor argentino Daniel Burman. Ele fez películas extraordinárias, como “Abraços partidos”, tendo Daniel Hendler como ator principal. A característica primordial do cinema do diretor é expor as fragilidades humanas por meio da sensibilidade. Há humanização de sentimentos sem o prévio julgamento. Deixa-se ser o que é, sem se importar com o certo ou errado. O mais importante é o retrato do próprio ser humano. Há também a conservação dos diálogos irônicos, debochados, mas ingenuidade defensiva. O espectador percebe o medo, a angustia e frustrações dos personagens. O humor, quase negro, direciona a trama. Inicia-se com uma discussão sobre qual caixão e qual coroa escolher. A camera quer participar e assim intromete quem está do outro lado da tela a bisbilhotar o que quiser. “Que sinal precisa para falar com sua mãe?”, deboche agressivo, mas permitido e humanizado dentro de suas regras sociais. Aborda-se a vida de dois irmãos. Distantes, vazios e necessários um ao outro. Ele, sensível. Ela, a razão. O irmão busca o recomeço de uma vida, após a mãe ter morrido. A irmã vive entre tramóias profissionais para o famoso sucesso que não vem. Como disse não há certo e ou errado. Há maneiras diferenciadas de sobrevivência. “Novo, vazio, mortos, paredes finas. É pressão nas torneiras”, diz-se, referenciando um apartamento a algumas características da realidade. Ela comporta-se perspicaz e persuasiva nos negócios para o desejado resultado, precisando mostrar o conhecimento social. Para isso afasta-se da mãe e vivencia o egocentrismo crônico. “O velório é um fracasso”, diz. As ações e interpretações teatralizadas e artificiais do começo do longa dão lugar ao aprofundamento gradual do sofrimento real deles. “Você vive da caridade de gente como eu”, diz-se o que pensa sem a importância do outro, externalizando a pequenez e a mesquinhez, manipulando o irmão´pelo que tem, mitigando a exposição do carinho. A metalinguagem aparece em forma de teatro. Ele quer ser ator, vivenciar outras vidas, sair um pouco da sua própria interpretação diária. “Teatro é para quem pode e não para quem quer”, diz-se. Eles se entendem. O irmão sabe como a sua irmã é: “Cara de pau”, “uma atriz da vida” e exagerada – que deslumbra a elegância das festas, assim mantem o respeito as suas inerências. Há uma outra fase no filme. O amor homossexual na velhice. Com uma madura sutileza, mostra-se o conhecimento de uma relação. Chimarrão, Peter Brooks, jazz, conversas irônicas sobre a infância, tudo pode ser apreciado com a música que suaviza o que se deseja aprofundar.

A simplicidade e a pureza são desejadas em tempos e maneiras diferentes, como por exemplo andar de moto na terceira idade. “Não é tragédia, é a minha tragédia”, diz-se. As ideias dela para se conseguir dinheiro são infinitas. Muda-se de ramo, abre correspondência alheia. O espectador sente o medo da personagem, que transpassa uma carência altiva, pedindo perdão por ser desse jeito. “Sem hipocrisias e sem metáforas”, diz-se. “Para atuar tem que saber quem é. E hoje você sabe”, filosofa-se entre risoto com segredo. “Fui feliz várias vezes, mas a felicidade acaba”, complementa-se. Há a substituição do sucesso. A improvisação talentosa dele gera o orgulho dela por ele. Entre os dois, passa-se o passado, resolvendo-se no presente, para que o futuro seja melhor. Excelente filme. Vale muito a pena assistir.

A Sinopse

Susana é egocêntrica e valoriza o próprio sucesso acima de tudo. Por esse motivo, deixou exclusivamente a cargo do irmão Marcos a tarefa de cuidar da mãe. Quando esta morre, Marcos se vê solteiro aos 64 anos e sem grandes realizações profissionais. Ao ser expulso por Susana do apartamento onde sempre morou com a mãe e obrigado a sair de Buenos Aires, vai buscar asilo em um resort no Uruguai. Lá, ingressa em um grupo de teatro, desenvolve amizades e recupera a vontade de viver. Mas as notícias de seu progresso desagradam a irmã. Baseado no romance Villa Laura, de Sergio Dubcovsky.

O Diretor

Nasceu em 1973, em Buenos Aires, e estudou Direito antes de começar a trabalhar com cinema. Iniciou a carreira em 1993, com o curta-metragem documental ¿En que estación estamos?. De 2000 a 2006, realizou a Trilogia da Perda, com os filmes Esperando o Messias (Melhor Filme no Festival de Havana), Abraços Partidos (Urso de Prata de Melhor Filme e de Melhor Ator no Festival de Berlim) e As Leis de Família, todos com o mesmo protagonista.